A
sexualidade é uma parte do todo que é a intimidade, sendo esta última uma parte
do todo que é uma relação amorosa. Assim, quando se fala de sexualidade deve-se
também enquadrá-la juntamente com outras dimensões que estão (ou devem estar)
presentes na construção de uma relação amorosa (assumindo a existência de uma
relação interdependente entre as mesmas), incluindo as várias subdimensões da
própria sexualidade. Não é objetivo deste texto explorar as dimensões inerentes
à sexualidade, mas acima de tudo pretende contribuir para reflexões e
discussões destas temáticas de uma forma mais completa e construtiva,
combatendo as grandes barreiras do desenvolvimento, da vivência e do discurso
da sexualidade. Mas, quais são as grandes barreiras da sexualidade? São, por um
lado, a «alimentação social» de um sentido redutor deste conceito, resumindo-o
exclusivamente ao ato genital, e ainda a recriminação dos discursos sobre esta
temática (mesmo que sob a alçada de conhecimentos fidedignos, úteis e claros),
levando a que mais facilmente se consolide o tabu que gira à sua volta; e, por
outro lado, há o aproveitamento (e/ou necessidade) de algumas pessoas para se
autoafirmarem sob a máscara de uma visão «aberta» ou «moderna» que, continuando
a focar-se exclusivamente no ato genital, culmina numa arrogância e
indelicadeza que de positivo não traz nada. Estas diferentes visões não são
facilitadoras da aprendizagem de uma vida sexual saudável e de forma
determinante impossibilitam um desenvolvimento pessoal e relacional equilibrado.
Portanto, se a sociedade quer evoluir positivamente nesta área tem que deitar
as barreiras abaixo e explorar o mundo multidimensional da sexualidade,
abrindo-se ao conhecimento de forma responsável e séria (mas não sisuda, nem
envergonhada, nem desavergonhada).
Neste
momento a pergunta que pode estar a pairar na cabeça dos leitores é a seguinte:
Se a sexualidade não é só o ato genital,
afinal o que é a sexualidade? A exploração/descoberta do(s) corpo(s), as
sensações, os sentidos, os sentimentos, a cumplicidade, a afetividade, as
fantasias, o respeito, a complexidade relacional, a união, o desejo, o amor, a
tolerância, a confiança, a amizade, a equidade, a compreensão, a aceitação e a
socialização são alguns conceitos que cabem na definição de sexualidade e que
se conciliam (ou se devem conciliar) na vivência e desenvolvimento da mesma,
num processo (relacional) que se desenrola ao longo da vida (logo, o
conhecimento e as competências exigidas devem ser trabalhadas desde cedo e
durante toda a vida para que sejam parte integrante do desenvolvimento pessoal
e relacional de todos nós). Efetivamente, para que a sexualidade seja vista e
vivida com mais sabedoria tem que se considerar o ato genital apenas como uma parte
do todo que é a sexualidade e que esta última não deve ser lida e vivida à
sombra de uma exclusividade biológica, pois também deve contar com a psicologia
e a sociologia (da sexualidade), entre outras áreas igualmente enriquecedoras.
A vivência da sexualidade é mais favorecida quando não se pensa só num corpo
saudável, mas também em todos os (muitos) aspetos que estão para além disso.
Para que tal aconteça devemos saber, compreender e aceitar que somos (pelo
menos) seres biopsicossociais (e não só seres biológicos). Desta forma,
estaremos mais predispostos para aprendermos mais sobre nós próprios (e
aceitarmo-nos como somos), sobre os outros (e aceitando-os como eles são), e
adquirirmos competências para enfrentarmos os desafios que nos são colocados no
dia-a-dia, ao nível pessoal e relacional, de forma mais eficaz.
Consequentemente sentir-nos-emos e estaremos mais seguros, confiantes e
responsáveis e os níveis de satisfação aumentarão consideravelmente, culminando
numa vivência bastante prazerosa da sexualidade e de todas as outras dimensões
igualmente importantes que estão presentes na vida de cada um e na sua relação
com os outros.
Sem
grande dificuldade conseguimos constatar que a criação e a evolução da vida (a
nossa essência e a existência) estão intimamente ligadas à sexualidade. Basta
pensarmos no processo que nos encaminhou para a (nossa) vida e em todo o
processo desenvolvimental que vivenciamos com as figuras mais significativas da
nossa vida. Por isso, não vejo razão para não falarmos aberta e
responsavelmente sobre a sexualidade nos diversos contextos (educacionais) que
nos vão transformando, ajudando a construir o nosso ser para um mundo de
interações positivas (isto é, conhecedoras) com outras pessoas. Aliás, é
fundamental que assim seja para que se viva a sexualidade de uma forma
saudável. Temos a responsabilidade de afastar os tabus, os preconceitos, as
crenças e os mitos à volta da sexualidade, que só levam a que as pessoas
reproduzam comportamentos desajustados, manifestamente escusados e prejudiciais
à sua vida, à dos outros e às dinâmicas relacionais com os outros. Qual a melhor maneira de atingirmos este
(ambicioso) objetivo? Proponho começarmos a criar momentos de discussão e
de reflexão junto da comunidade (dos mais jovens às pessoas com mais idade, com
a devida adequação discursiva, considerando as etapas desenvolvimentais das
pessoas e outras caraterísticas pertinentes do público-alvo). Assim, os
pensamentos começarão a fluir positivamente neste campo, o que é essencial. A
forma como pensamos a sexualidade influencia direta e significativamente os
nossos comportamentos perante a mesma (isto é, a vivência da sexualidade), logo
é fulcral para um desenvolvimento pessoal e social mais equilibrado a
implementação de projetos de educação sexual ou, num âmbito mais alargado,
projetos de educação para os relacionamentos ou para as relações interpessoais
(abarcando o contexto escolar e familiar, através de iniciativas junto da
comunidade). Projetos que têm que ser feitos com e para as pessoas e não
através de métodos exclusivamente expositivos (e autocentrados numa boa
performance pessoal).
A
ação política tem uma palavra importante para dar neste campo, de preferência
com o suporte de especialistas. Muitas visões políticas, que deveriam ser um
meio propagador de ricos ensinamentos nesta matéria, não conseguem abarcar a
importância desta mensagem e continuam a optar por se fecharem na ignorância
e/ou no comodismo social e político-partidário, ou ainda mascarando as ações
com (a insistência em) programas bastante incompletos e, muitas vezes, com
efeitos nefastos (para a vivência da sexualidade), pelas escolhas que
determinam para a liderança da aplicação dos mesmos. Não podemos aceitar que
continuem a cair nos mesmos erros (ou nas mesmas ações deliberadamente
erróneas) de não escutarem as pessoas mais competentes nestes campos de ação,
que são aquelas que podem melhorar a educação (multidisciplinar) para a
sexualidade. Todavia, contando ou não com a competência das entidades
governativas, políticas e partidárias, devemos agir de uma forma proativa
enquanto profissionais e cidadãos, assumindo uma posição clara e firme nos
microcontextos da vida de cada um. Temos que acreditar que um dia todas as
nossas ações traduzir-se-ão em modelos (com efeitos) muito positivos a uma
escala mais alargada. Se não chegarmos tão longe, já é motivo de grande
regozijo o enriquecimento (mútuo) que advém dos momentos de partilha com as
pessoas, dos mais jovens aos mais idosos (que merecem ter uma vivência saudável
da sexualidade).

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