O número considerável de separações e divórcios e,
concomitantemente, o aparecimento de novos relacionamentos (pós-divórcio), têm
trazido novos desafios para as relações amorosas, principalmente quando os
projetos comuns vão ser pensados para mais do que duas pessoas, pelos filhos
que vêm de relações anteriores ou da relação anterior (de um elemento do casal
ou de ambos). Desta forma, de acordo com o que é esperado, coexistirão no futuro
espácio-temporal os filhos de um, de outro e de ambos (quando todos os fatores
se conjugam). Todavia, nem sempre acontece exatamente como referi, nomeadamente
no que concerne à permissão da entrada dos filhos de um e de outro, provindos
de relacionamentos anteriores. Neste caso, há várias pessoas que, ao iniciar um
novo relacionamento com estas caraterísticas, dificultam e resistem à entrada
dos «filhos dos outros» na nova vida que pretendem criar. Nalguns casos, homens
e mulheres, rejeitam mesmo, sendo essa rejeição apenas para os «filhos dos
outros» e não para os seus filhos que também surgiram de relacionamentos
anteriores, quando tal acontece. Mas, nem sempre se trata de uma intransigência
bastante severa de um dos elementos do casal, pois há ex-mulheres ou ex-maridos
que complicam bastante estes processos, impulsionando as crianças a não
gostarem dos(as) novos(as) namorados(as) do seu pai ou da sua mãe (e, muitas
vezes, incitando na direção do próprio pai ou da mãe – utilizar a criança como
um dos meios para atingir os seus fins), tendo como consequência um
comportamento mais distante ou até agressivo das crianças em causa para com o
novo elemento na vida do pai ou da mãe (e mesmo das figuras mais significativas
– nalguns casos até se «virando o feitiço contra o feiticeiro»). Ora, se para
os pais é mais suportável e procuram por todos os meios possíveis mudar esta
situação, já os seus novos companheiros podem ficar tão desgastados que,
vencidos pelo cansaço, dizem o seguinte: «Não estou para aturar os filhos dos
outros! Não aguento mais!» (por vezes, em tom de «ou ela/e ou eu!», noutras
vezes, apenas um desabafo). É que estas situações acabam por ocupar uma grande
parte do tempo do casal, gerando, logo numa fase inicial, uma tempestade que
teima em testar ao limite a relação (ainda frágil) e as individualidades
(tolerância ao stress, precisa-se!). Reitero, contudo, que estas verbalizações
dos(as) novos(as) companheiros(as) nalguns casos não aparecem pela intromissão
(direta ou indireta) dos «ex», nem por qualquer «mau comportamento» dos «filhos
dos outros», mas por uma imposição própria. Há, porém, bons exemplos de casais
que convivem de uma forma muito construtiva e positiva (para os adultos e para
as crianças) com estas exigentes dinâmicas familiares (consequente de um
comportamento ajustado no processo de separação ou divórcio, em que (quase) tudo
é bem resolvido, principalmente com os filhos, e ainda de uma aberta e clara
discussão no início do novo relacionamento para que não haja dúvidas e
desencontros quanto ao que pretendem no futuro – onde entra a disponibilidade para
negociar e cooperar). São verdadeiros modelos positivos e inspiradores. Assim,
para ajudar os casais a pensarem melhor sobre este assunto, deixarei um conjunto
de respostas às seguintes questões:
Quais são as vantagens de encararmos de forma madura e responsável a(s)
realidade(s) destes novos desafios nos relacionamentos?
Quais
são as vantagens de amarmos (ou de, pelo menos, aceitarmos para a nossa vida) os
«filhos dos outros»?
- Garantimos um desenvolvimento mais saudável das crianças
em causa;
- Facilitamos o processo de divórcio aos filhos afetados,
ajudando a passar a mensagem que há mais vida para além do divórcio dos seus
pais e, inclusivamente, há liberdade para estarem para sempre com ambos os pais
(que não propriamente em simultâneo);
- Aumentamos a riqueza familiar da criança (pela diversidade
e disponibilidade de recursos), com a entrada de mais uma pessoa com quem pode
contar para a sua vida;
- Afirmamos perante todos que não concordamos com a
existência de um direito em que os adultos podem optar por integrar ou excluir
as crianças (neste caso, «os filhos dos outros»), pois a segunda opção nem
sequer deve ir a jogo (podendo optar somente pela presença do adulto na sua
vida – isto é, o novo companheiro);
- Não contribuímos para a aplicação de uma «pena» aos
«filhos dos outros», pela decisão de separação ou divórcio dos pais;
- Garantimos bons modelos para os nossos filhos e também
para os «filhos dos outros», pelo exemplo que damos (pela vantagem da
replicação deste respeito pelos outros nas suas relações interpessoais –
estamos, assim, diretamente, a ajudar os nossos filhos e, indiretamente, a
ajudar outras crianças das próximas gerações);
- Aumentamos a admiração que o(a) nosso(a) companheiro(a)
sente por nós;
- Transformamos positivamente a confiança dentro da nova
relação, permitindo chegar mais facilmente a maiores níveis de intimidade no
casal;
- Reforçamos a felicidade que o(a) nosso(a) companheiro(a)
almeja, especialmente na relação connosco e com os seus (e nossos) filhos;
- Cultivamos uma atitude mais solidária para com a vida;
- Os nossos filhos, num futuro não muito distante,
usufruirão de ferramentas úteis para usarem nas suas relações (por exemplo, o
bom desenvolvimento da sensibilidade interpessoal e o impacto da adoção de
posições assertivas nas tomadas de decisão) e para aconselharem os seus amigos
em dificuldades;
- Ajudamos a compreender a importância de vivermos num mundo
real em que as pessoas são reais e as realidades têm que ser encaradas com
maturidade e sabedoria (de preferência, não pensando só em nós). É mais
atrativo (e ilusório) jogar só com as peças do tabuleiro que consideram eficazes
para vencer o jogo, ou seja, deixando de fora aquelas que dão poucas garantias
de um jogo perfeito (isto é, aparentemente atrapalham as expetativas e os
sonhos – o mundo ideal);
- Colocamos no topo da pirâmide hierárquica a
responsabilidade que os adultos têm com as crianças, não havendo a
possibilidade do adulto escolher entre um filho e um(a) companheiro(a), a não
ser que o segundo seja preterido;
- Não roubamos às crianças direitos, oportunidades,
expetativas, sonhos, e o futuro (com, pelo menos, o pai e a mãe);
- Não retiramos da vida do(a) novo(a) companheiro(a) uma
peça importante da sua vida, pelo que estamos a dar-lhe anos de vida;
- Permitimos aos nossos filhos, aos filhos de ambos e aos «filhos
dos outros» uma convivência muito especial na diversidade (onde, conjuntamente,
vão aprender imenso uns com os outros e, possivelmente, com as vários elementos
da família alargada);
- Afirmamos que esta tomada de decisão, de integração dos
«filhos dos outros», não foi difícil, por termos feito o seguinte exercício:
colocarmo-nos no lugar do(a) companheiro(a), e, acima de tudo, no lugar das
crianças (os «filhos dos outros»), questionando «Como é que eu me sinto com
esta situação? O que espero?»;
- Vamos viver melhor connosco próprios, num clima de paz (e
amor).
Encontrem as respostas que faltam nas práticas que vão
implementar (e partilhem) …
Sem comentários:
Enviar um comentário